Portas de banheiro: onde tudo pode ser dito






Algo que estudos na área de Análise do Discurso nos mostram constantemente é que não há discursos neutros, mas sim discursos marcados pelos posicionamentos sociais, culturais e ideológicos dos sujeitos produtores.

No espaço dos banheiros públicos isso não é diferente. O ambiente que é privado e, paradoxalmente, público dos banheiros confere aos indivíduos o anonimato. Entretanto, este não faz com que os discursos produzidos sejam marcados pela neutralidade. A expressão dos posicionamentos dos indivíduos acaba sendo potencializada no espaço solitário dos banheiros.

Conforme destacam Vilar, Pereira e Silva (2006, p. 2): “Não há pudores, tudo pode ser dito [...]”. Barbosa (1984, p. 195) reforça essa ideia ao afirmar que, no espaço da cabine do banheiro, “[...] a privacidade parece garantir a pessoas anônimas um diálogo livre de censura [...]”.   

Essa possibilidade de liberdade de expressão chama a atenção de alguns estudiosos, como Vilar, Pereira e Silva (2006) e Paula (2010), e os levam a investigar os discursos que se fazem presentes nas portas dos banheiros.

Paula (2010), por exemplo, realizou a análise de grafitos produzidos em banheiros de universidades partindo do princípio de que os textos escritos pelos alunos contribuem para a compreensão de:



[...] como eles pensam e [...] do que eles pensam que pensam [...] dentro do ambiente da instituição educacional ‘Universidade’ [...]. (PAULA, 2010, p. 331).


Vilar, Pereira e Silva (2006, p. 1) também compreendem os grafitos de banheiro como a representação da “[...] voz coletiva de um grupo perfeitamente localizável e localizado [...]”. De acordo com eles, os sentidos produzidos nos grafitos e o modo como estes funcionam possibilitam uma aproximação aos tópicos do coletivo que os gerou. (VILAR; PEREIRA; SILVA, 2006).

Com base na perspectiva de Santos (2011, p. 2), o que se quer ressaltar aqui é que os “[...] banheiros não só ouvem como falam”. Isso porque além do fato dos escritos neles produzidos dialogarem entre si, tem-se o fato de que os escritos dialogam com os frequentadores dos banheiros, provocando-os, “[...] gerando opiniões, sensações e reflexões variadas [...]”.

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REFERÊNCIAS:


BARBOSA, Gustavo. Grafitos de banheiro: A literatura proibida. São Paulo: Brasiliense, 1984, 201 p.

PAULA, Joarez Jociano de. Discursos das portas de banheiros universitários. In: VI SEMINÁRIO DE PESQUISAS EM LINGUÍSTICA APLICADA, 2010, Taubaté,  Anais... Taubaté: Universidade de Taubaté, 2010. p. 331- 353. Disponível em: < http://site.unitau.br//scripts/prppg/la/6sepla/site/
resumos_expandidos/PAULA_Joarez_Jociano_p_
331_353.pdf>. Acesso em: 04 jul. 2011.

SANTOS, Ludmila Helena Rodrigues dos. Paredes que ouvem e portas que falam: uma etnografia de banheiros, grafitos e interações. In: VII ENECULT - ENCONTRO DE ESTUDOS MULTIDISCIPLINARES EM CULTURA, 2011, Salvador. Disponível em: <http://www.enecult.ufba.br/modulos/consulta&re
latorio/rel_download.asp?nome=33961.pdf>. Acesso em: 18 maio 2012.

VILAR, Fernanda Salomão; PEREIRA, Pedro Henrique Cavano; SILVA, Tiago Elídio da. Análise do discurso dos escritos de banheiro na Universidade. Disponível em: <http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publica
coes/textos/a00009.htm>. Acesso em: 21 jun. 2011.



Autora: Aline Matias.  




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